terça-feira, 12 de agosto de 2025
terça-feira, 29 de julho de 2025
Quando eu nasci, as manhãs chegavam,
sem o estudo do mercado,
com as horas fermentadas
e sabor a feijão branco.
Quando eu nasci, a voz de minha mãe
subia a passo firme
pelas janelas
e o céu andava sempre pelos telhados.
Depois, chegaram os outros
e alguém se lembrou
de me dizer que a terra vacilava
e o sol nem se movia.
Foi então que eu, já tão morta de cansaço
e já tão desgovernada,
saí sozinha de casa
e caí na poesia.
Maria da Fonte
terça-feira, 22 de julho de 2025
terça-feira, 8 de julho de 2025
Faz-te de barro,
frágil como um jarro.
Cheia de medos
e angústias sem nome.
Contrai o peito,
arquiva os desaires,
impulsiona a dor até ao chão.
Com a palavra mais longa do
mercado,
carrega o verbo,
pontua a desgraça.
Se ainda houver
quem te não reconheça,
põe-te de cócaras.
E, num punhado azedo
de metáforas,
retoca a sombra
redonda dos teus dias.
Maria da Fonte
Imagem retirada da internet
domingo, 15 de junho de 2025
Todas as tardes,
de sapatos
gastos,
descia a ladeira
a buzinar ao
vento.
E agachada
nas curvas de
um gato,
atirava as
pernas
e trepava o
tempo.
Nos ramos rijos
de arcos de
caça,
desenhava as horas
e esticava a
mão.
Dizia-as
maduras
como ampulhetas
ou tambor de
férias,
sem cair ao
chão.
Minha mãe ouvia
e simulava a
queda
enquanto estendia
a colher da
sopa.
Eu balbuciava
palavras sem margens
que as horas
cabiam…
E abria a boca.
Maria da Fonte
domingo, 8 de junho de 2025
Pois então não esperem de mim
grande ciência.
Em abono da verdade, este meu
compromisso
com a vida,
tantas vezes permeável,
Tantas vezes fugaz,
fez de mim soldado
numa guerra que
sabia
de antemão
perdida.
Se é natural
que os dias me escorreguem
das mãos sem o apertar do gatilho?
Talvez.
Como os beijos e as flores,
os moldes e os lugares,
o copo e o vinho.
Deixem-me, por isso, brindar a
este tempo
emprestado, que as taxas de juro
andam pela hora da morte,
e eu quero acreditar
que estou longe,
muito longe,
do destino.
Maria da Fonte
quarta-feira, 9 de abril de 2025
quarta-feira, 1 de janeiro de 2025
Talvez a mão esquerda
vá sem jeito
e a direita não seja mais o que
era.
Talvez uma estrela mais a norte,
ou a norte a luz que entendas seja
rara.
Talvez o declive do teu braço
seja o acaso ou só delicadeza,
e o tempo que medeia cada traço
seja a brisa que te leva ou te
separa.
Talvez o engenho, meu amigo,
esteja na arte da saber arredondar
as formas planas do teu dia
no rosto limpo
da pedra lapidar.
Maria da Fonte