sábado, 14 de novembro de 2020

 


Inclina-te sobre os homens que anoitecem,

toma-lhes as mãos das molduras e

segreda-lhes retratos como beijos.

 

Não sacudas, nem levantes as palavras,  

se alguma nuvem solta se afigura.

 

Recolhe o frio calada

e faz o céu que puderes àquela hora.

 

Quando levantas a voz, nada que é teu ganha altura.


Maria da Fonte

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

 


Que a tarde foi isolada no perímetro da sombra,

declara-se nas varandas

 luto em primeira mão.

 

Da torre, um relógio atónito

recolhe os dados clínicos,

atualiza o histórico e mede-lhe a pulsação.

 

O quadro é reservado,

batimentos arrastados. Bradicardia, profere.

 

Do outro lado da rua, velhos estáticos como barras

(um metro e meio os sucede)

a fazer lembrar capelas

 

ou gráficos 

confinados às molduras de parede.


domingo, 8 de novembro de 2020

 


Como se enganam os senhores da alta-costura

quando ajustam a gente à etiqueta

e penhoram as ancas no tecido.

 

Chegam sempre de madrugada neste registo.

Trazem no peito a praça e um cabide,

como se fossem poetas

e as mulheres redondilhas

sem lugar a pernas flácidas.

 

Os senhores de alta-costura

engomam versos em série

e gastam as  horas  nisto.

 

Maria da Fonte

Fernando Botero