quinta-feira, 27 de março de 2014

Ponte de Lima



O vento sopra em surdina,
Numa serenata errante,
O choro de uma menina
Ao ver partir um Gigante.

De olhar tão triste, cansado,
Surgiu deitada no leito,
Com o vestido molhado,
Com uma chaga no peito.

Um corpo jovem, esguio,
Dois seios, torres fatais,
Deitada ao longo do rio
Entre as pontes, os beirais.

E vendo além a cadeia
Onde encarcerar a dor,
Alimentava essa ideia
De morrer ali de amor.

Mas ao banhar-se no estio,
Foi esquecendo a dor ardente,
Ou porque fosse do rio,
Ou porque fosse da gente.

Hoje é princesa do Lima,
Legado, foro distante.
Alguns lhe chamam menina,
Outros segredam amante.


Maria da Fonte

sábado, 1 de março de 2014

Regresso



Levai-me, vento do norte, ao ventre
de minha mãe, falai-lhe da minha sorte,
mas não digais a ninguém.

Se ela, por medo, chorar ou, por culpa,
adoecer, dizei-lhe, para a acalmar,
que eu preferi não nascer.

Só ela me entenderá, só ela
sabe tão bem que a rosa sem a redoma
fica à mercê de quem vem.

No breve correr das horas, onde nunca
sei de mim, dizei-lhe que tenho medo,
que quero o seu ventre, sim.

E antes que gaste o que tenho à procura
do que sou, quero saber ao que venho
no ventre que me gerou.

Pois se hei de voltar um dia ao ventre
de mais alguém, que seja ao ventre da terra
no ventre de minha mãe.


Maria da Fonte
Imagem retirada da internet